BDE NEWS – Outubro (2024)
Confira o boletim aqui.
- Reforma Tributária: Atualizações
Em mensagem publicada no Diário Oficial da União de 04.10.2024, o Presidente da República solicitou ao Congresso Nacional a retirada de urgência do Projeto de Lei Complementar (PLP) 68/2024, que estabelece regras gerais relativas ao Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), à Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e ao Imposto Seletivo (IS). A medida em questão já era esperada, uma vez que, desde setembro, o referido PLP estava trancando a pauta do Senado.
Após a retirada de urgência, o Senador Eduardo Braga foi designado relator do projeto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.
Além disso, foi iniciada a segunda fase do Programa de Assessoramento Técnico à Implementação da reforma do consumo (PAT-RTC 2), que visa acompanhar a tramitação dos PLPs 68/2024 e 108/2024 no Congresso Nacional, bem como prestar apoio às administrações fazendárias da União, dos estados e dos municípios na fase inicial de implementação. O aludido programa será integrado pelos seguintes “órgãos”:
(i) “Comissão de Sistematização” (COSIT), instância máxima a ser coordenada por Bernard Appy, que será responsável pela avaliação e consolidação de todo o trabalho realizado;
(ii) Grupo de análise jurídica, que irá auxiliar as demais instâncias relativamente aos aspectos jurídicos;
(iii) Equipe de quantificação, que será responsável por desenvolver as premissas e metodologias de cálculo da alíquota-padrão e dos regimes especiais do IBS e da CBS; e
(iv) Grupo Técnico, que cuidará do split payment.
Adicionalmente, em 23.10.2024, a CCJ aprovou o plano de trabalho para a discussão do PLP 68/2024. No total, serão realizadas 11 audiências públicas e duas sessões temáticas no Plenário do Senado antes da votação do texto. Segundo Eduardo Braga, o objetivo é que o referido PLP seja aprovado ainda esse ano[1].
Por fim, na noite de 30.10.2024, a Câmara dos Deputados aprovou o texto final do PLP 108/2024, que regulamenta o funcionamento do Comitê Gestor do IBS (CG-IBS), o contencioso tributário desse imposto, outras questões relacionadas à sua administração e operacionalização, como a fiscalização e a cobrança, além de introduzir mudanças relevantes à legislação do ITCMD e do ITBI.
Até a data de fechamento deste caderno, o texto do PLP 108/2024 aprovado pela Câmara ainda não havia sido publicado. Assim, para garantir uma análise detalhada e precisa, as alterações referentes ao projeto serão abordadas na edição de novembro do BDE News.
- Governo publica MP que institui adicional de CSL para tributação mínima de 15% sobre lucros de multinacionais
Em 03.10.2024, foi publicada a Medida Provisória (MP) 1.262/2024, que, visando adequar a legislação do Brasil às Regras Globais Contra a Erosão da Base Tributária (“Regras GloBE”) do Pilar 2 da OCDE, estabeleceu a tributação mínima de 15% sobre os lucros auferidos no país por multinacionais com receita a partir de 750 milhões de euros.
O não cumprimento, por parte das Entidades Constituintes localizadas no Brasil, da prestação de informações para cálculo do adicional, poderá resultar em multa de 0,2% da receita anual por mês de atraso, limitada a 10% ou R$ 10 milhões.
Também em 03.10.2024, foi publicada a Instrução Normativa (IN) RFB 2.228/2024, que regulamenta a MP 1.262/24 e dispõe sobre o processo de adaptação da legislação brasileira às Regras GloBE. A referida IN também prevê hipóteses de simplificação das Regras GloBE, em que o adicional de CSL será zerado mediante o cumprimento de determinados requisitos.
- Decreto afasta a qualificação como paraísos fiscais de países que realizarem investimentos significativos no Brasil
Em 18.10.2024, foi publicado Decreto para regulamentar o art. 24-C da Lei 9.430/1996, que trata dos critérios para a qualificação de país ou dependência com tributação favorecida – conhecidos como “paraísos fiscais” – ou de regime fiscal privilegiado (Decreto 12.226/2024).
O referido decreto permite que seja afastada a qualificação de “país ou dependência com tributação favorecida” ou de “regime fiscal privilegiado” nos casos de países (i) que sejam assim qualificados exclusivamente por não tributarem a renda à alíquota máxima de 17% e (ii) que fomentem, de forma relevante, o desenvolvimento nacional por meio de investimentos significativos no Brasil.
De acordo com o novo diploma normativo, são considerados investimentos significativos o (i) título direto emitido pelo Governo brasileiro; e (ii) investimento direto no capital de empresas brasileiras ou em fundos de investimentos brasileiros, de acordo com a definição de investimento direto no país (participação no capital) dado pelo Banco Central do Brasil, por país do controlador final do investimento direto, com prioridade para aumento de capital fixo e atividades alinhadas a práticas sustentáveis.
Note-se que o afastamento da qualificação como “paraíso fiscal” não será automático, mas deverá ser requisitado ao Ministério da Fazenda por meio da apresentação dos elementos que demonstrem a intenção de cumprimento dos requisitos previstos.
- Governo publica MP que adia a exclusão de perdas de créditos inadimplidos da base de cálculo do IRPJ/CSL de instituições financeiras
Em 02.10.2024, foi publicada a MP 1.261/2024, que altera as regras de exclusão do lucro líquido para fins de apuração do IRPJ e da CSL de instituições financeiras, de perdas relativas a créditos que se encontrem inadimplidos em 31.12.2024, e que não tenham sido deduzidas ou recuperadas até essa data.
Relembre-se que a Lei 14.467, de 16.11.2022, estabeleceu novo tratamento tributário aplicável às perdas incorridas no recebimento de créditos de instituições financeiras. Em sua redação original, a referida norma previa que estas perdas seriam deduzidas em 36 parcelas mensais a partir de abril de 2025. Com a publicação da MP 1.2361/24, contudo, o número de parcelas passou para 84 ou 120, e as perdas só serão excluídas a partir de janeiro de 2026.
- PGFN publica Portaria que altera regras de transação
Em 16.09.2024, foi publicada a Portaria PGFN 1.457/2024, que alterou as regras para celebração de acordos de transação de créditos fiscais da União e do FGTS.
Entre as alterações promovidas pela referida Portaria, destaca-se a nova exigência de que os contribuintes mantenham regularidade perante a PGFN e a RFB após a formalização do acordo (tendo estabelecido a obrigatoriedade de regularização de novos débitos no prazo de noventa dias).
O recém-editado ato normativo da PGFN também estabelece novas regras e limitações quanto às hipóteses de irrecuperabilidade presumida de créditos. Como se sabe, nos casos de irrecuperabilidade presumida, as dívidas fiscais do sujeito passivo aproveitam os benefícios da transação em seus limites máximos (p.ex. número máximo de prestações de parcelamentos e descontos máximos das dívidas).
Quanto a isso, a Portaria 1.257/24 determina que:
(i) a irrecuperabilidade dos créditos de pessoa jurídica não é presumida em razão de procedimento de baixa por liquidação voluntária (§ 2º, art. 25, Portaria PGFN 6.757/2022); e
(ii) a condição de devedor em recuperação extrajudicial deverá ser comprovada mediante prova da existência de processo em fase de impugnação ao plano de recuperação extrajudicial, ou de sentença homologatória proferida há menos de dois anos (§3º, art. 25, Portaria PGFN 6.757/2022).
- Publicado Convênio CONFAZ que disciplina diversos aspectos da operação de remessa interestadual de mercadorias a estabelecimentos de mesma titularidade
Em 07.10.2024, foi publicado o Convênio ICMS 109/2024, que dispõe sobre a remessa interestadual de bens e mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade. Trata-se de nova tentativa do CONFAZ de se adequar ao entendimento fixado pelo STF quando do julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 49, que reconheceu a não incidência do ICMS sobre o deslocamento físico de mercadorias pelo mesmo contribuinte, bem como à Lei Complementar (LC) 204/2023, que alterou a Lei Kandir, entre outros pontos, para facultar aos contribuintes equiparar as transferências de mercadoria à operação sujeita ao recolhimento do ICMS.
Entre as principais regras estipuladas no novo Convênio, destacam-se as seguintes:
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- Na remessa interestadual de mercadorias a estabelecimento de mesma titularidade, assegura-se ao contribuinte o direito à transferência de crédito do ICMS relativo às operações anteriores, ficando a unidade de origem obrigada a garantir apenas a diferença positiva entre os créditos pertinentes às operações anteriores e o resultado da aplicação das alíquotas interestaduais do imposto sobre o valor atribuído às mercadorias (cláusula primeira);
- A base de cálculo na referida transferência de créditos será: (i) o valor médio da entrada da mercadoria em estoque na data da transferência; (ii) o custo da mercadoria produzida, assim entendida a soma do custo da matéria-prima, insumo, material secundário e de acondicionamento; e (iii) em se tratando de mercadorias não industrializadas, a soma dos custos de sua produção (e.g. gastos com insumos e material de acondicionamento) (cláusula quarta, § 1º);
- Possibilidade de o contribuinte optar pela equiparação da remessa de mercadorias a estabelecimentos de sua titularidade a operação regularmente tributada. Nesse caso, será considerado como o “valor da operação” para determinação da base de cálculo do imposto: (i) o valor correspondente à entrada mais recente da mercadoria; (ii) o custo da mercadoria produzida, assim entendida a soma do custo da matéria-prima, material secundário, mão-de-obra e acondicionamento; e (iii) em se tratando de mercadorias não industrializadas, a soma dos custos de sua produção (e.g. gastos com insumos e material de acondicionamento) (cláusula sexta, caput e § 1º); e
- A opção por essa sistemática alternativa será anual, irretratável para todo o ano-calendário (cláusula sexta, § 2º, I).
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- STF decide que discussão relativa à cobrança de DIFAL do ICMS é matéria infraconstitucional
Em 12.10.2024, o Plenário do STF decidiu, por maioria de votos, pela inexistência de repercussão geral na discussão relativa à cobrança do diferencial de alíquota do ICMS (DIFAL) em operações interestaduais com destino a consumidor final contribuinte do referido imposto (RE 1.499.539 – Tema 1.331). Os ministros entenderam que a questão seria de índole infraconstitucional.
No caso concreto, o TJMG proferiu decisão no sentido de ser devida a cobrança do DIFAL do ICMS no caso de operação interestadual com destino a consumidor final contribuinte do ICMS, nos termos do art. 155, § 2º, inciso VIII, “a”, da CF/1988. Por outro lado, o contribuinte sustentou que a cobrança em questão dependeria de prévia regulamentação por lei complementar (que só veio a ser editada em 2022 – LC 190/2022).
Prevaleceu o entendimento do Relator (Rel.), Ministro (Min.) Luís Roberto Barroso, no sentido de que “a Lei Complementar nº 87/1996 contemplaria as normas gerais para cobrança de ICMS-DIFAL de consumidores finais contribuintes.”
- STF declara inconstitucional a cobrança do IRRF à alíquota de 25% sobre aposentadoria e pensão de não residente
Em julgamento finalizado 19.10.2024, o Plenário do STF declarou, por unanimidade, a inconstitucionalidade do art. 7º da Lei 9.779/1999, que prevê a cobrança de 25% do IRRF sobre os rendimentos de aposentadoria e pensão de brasileiros que residem no exterior (Tema 1.174 da Repercussão Geral – ARE 1.327.491).
De acordo com o voto proferido pelo Rel., Min. Dias Toffoli, “considerando-se que as aposentadorias e as pensões consistem, em regra, para quem as recebe (idosos, crianças, adolescentes e pessoas com deficiência), em suas principais fontes de renda (quando não as únicas), entendo que a legislação instituiu tributação simplesmente proporcional, e não progressiva, incidindo em inconstitucionalidade.”
Ainda segundo Toffoli, a tributação à alíquota única de 25% viola não apenas a progressividade, mas também os princípios do não confisco, da isonomia, da proporcionalidade e da capacidade contributiva, na medida em que representa uma “carga tributária efetiva muito mais gravosa, sem justificativa razoável, em face dos residentes no exterior do que dos residentes no país que recebem rendimentos de aposentadoria ou de pensão de fontes aqui localizadas”.
Diante disso, o Tribunal firmou a seguinte tese de repercussão geral: “É inconstitucional a sujeição, na forma do art. 7º da Lei nº 9.779/99, com a redação conferida pela Lei nº 13.315/16, dos rendimentos de aposentadoria e de pensão pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a residentes ou domiciliados no exterior à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de 25% (vinte e cinco por cento)”.
- STF estabelece limite de 100% à aplicação de multa punitiva
Em 03.10.2024, o STF decidiu, por unanimidade de votos, que a multa qualificada aplicada em razão de sonegação, fraude ou conluio, deve se limitar a 100% do tributo, ressalvados os casos de reincidência, em que a multa punitiva poderá atingir o patamar de 150% (RE 736.090 – Tema 863 da Repercussão Geral).
Nos termos do voto proferido pelo Rel., Min. Dias Toffoli, os limites estabelecidos de 100% para casos de sonegação, fraude ou conluio, e de 150% para reincidentes, previstos na legislação federal (art. 44, §§ 1º, 1º-A e 1º-C da Lei 9.430/1996, conforme redação dada pela Lei 14.689/2023), estão em consonância com os princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade.
Desse modo, os Ministros entenderam que, até que seja editada lei complementar federal sobre o tema, a multa punitiva “deve se limitar a 100% (cem por cento) do débito tributário e, em caso de reincidência como definida no art. 44, § 1-A, da Lei nº 9.430/96, incluído pela Lei nº 14.689/23, a 150% (cento e cinquenta por cento) do débito tributário.”
Além disso, o Tribunal modulou os efeitos da decisão para que ela somente produza efeitos a partir da edição da Lei 14.689/2023 (21.09.2023), ressalvadas as ações judiciais e processos administrativos pendentes de conclusão até a referida data.
- STF: Decreto que restabelece alíquotas de PIS e COFINS não se sujeita à anterioridade nonagesimal
Em 14.10.2024, o Tribunal Pleno do STF concluiu o julgamento da ADC 84 e da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.342, em que se discutia a aplicabilidade da anterioridade nonagesimal ao Decreto 11.374, de 01.01.2023. O referido decreto reestabeleceu as alíquotas do PIS/COFINS sobre receitas financeiras, as quais haviam sido anteriormente reduzidas pelo Decreto 11.322, de 30.12.2022, publicado apenas dois dias antes. O tribunal decidiu, por unanimidade, pela inaplicabilidade do referido princípio.
Relembre-se que, no penúltimo dia do seu mandato, o então vice-presidente da República, Hamilton Mourão, promulgou o Decreto 11.322/2022, reduzindo pela metade as alíquotas das contribuições incidentes sobre receitas financeiras. No entanto, no primeiro dia de seu mandato, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva editou Decreto 11.374/2023, restabelecendo as referidas alíquotas aos patamares normais.
Durante o julgamento, o Rel., Min. Cristiano Zanin, considerou que, pela sua vigência extremamente efêmera, as alíquotas reduzidas previstas pelo Decreto 11.322/2022 não geraram qualquer expectativa por parte dos sujeitos passivos e, por via de consequência, a extinção da norma não atrai a aplicabilidade do princípio da anterioridade nonagesimal.
- STF retoma julgamento sobre a tributação dos lucros de empresas estrangeiras controladas por empresas nacionais
Em 04.10.2024, o STF retomou o julgamento virtual do Agravo Regimental no RE 870.214, que discute a incidência do IRPJ e da CSL sobre lucros auferidos por empresas situadas em países com os quais o Brasil possui tratado para evitar a bitributação da renda, e que sejam controladas por empresas nacionais.
No caso em questão, discute-se a aplicação do art. 74 da MP 2.158-35/2001, que prevê a incidência do IRPJ/CSL sobre rendimentos de controladas no exterior, em confronto com o art. 7º dos tratados bilaterais firmados entre Brasil e Dinamarca, Bélgica e Luxemburgo, que estabelece que as controladas de empresa no Brasil situadas em outro estado signatário só poderão ter seus lucros tributados no país em que estiver instaladas.
Quando do início do julgamento, em 10.05.2024, o Min. Rel. André Mendonça proferiu voto no sentido de que a matéria teria índole infraconstitucional. Subsidiariamente – se reconhecido o caráter constitucional da matéria – votou por negar provimento ao agravo interposto pela União, uma vez que deveria prevalecer os tratados internacionais em detrimento da norma brasileira. Para o relator, a MP visa apenas a tributação do lucro, hipótese expressamente obstada pelos acordos internacionais bilaterais firmados pelo Brasil com aqueles três Estados analisados no caso concreto.
O julgamento havia sido suspenso após o pedido de vista do Min. Gilmar Mendes, e retornou no início do mês com voto-vista desfavorável aos contribuintes, no sentido da existência de caráter constitucional na matéria em discussão e da possibilidade de tributação dos rendimentos em questão. Mendes defendeu que os tratados devem ser interpretados com cautela e que, no caso em questão, não haveria bitributação, uma vez que “quem está sendo tributado é a empresa investidora brasileira, relativamente aos rendimentos auferidos por meio de um investimento no exterior. Ainda que essa mesma renda seja objeto de tributação pela jurisdição onde a entidade estrangeira encontra-se localizada, estar-se-ia diante de mera dupla tributação econômica, diante da diversidade de sujeitos”.
Após o voto do Min. Gilmar Mendes, o processo foi suspenso novamente por pedido de vista do Min. Alexandre de Moraes.
- STF: É cabível o ajuizamento de ação rescisória em face de decisão transitada em julgado em desacordo com a modulação estabelecida no Tema 69 da RG
Em 19.10.2024, o Tribunal Pleno do STF decidiu, por maioria, ser cabível o ajuizamento de ação rescisória em face de decisão transitada em julgado em desacordo com a modulação dos efeitos da tese de repercussão geral do Tema 69 (Inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS). O entendimento em questão foi proferido no âmbito do RE 1.489.562 (Tema 1.338 da Repercussão Geral)
Relembre-se que, por ocasião do julgamento do Tema 69, o STF fixou a tese de que o ICMS não compõe a base de cálculo das referidas contribuições. Posteriormente, em sede de aclaratórios, os Ministros modularam os efeitos da tese, para que o acórdão somente produzisse efeitos a partir de 15.03.2017.
Ocorre, contudo, que os critérios de modulação de efeitos dessa tese geraram diversas controvérsias, motivo pelo qual, em 23.09.2023, o Supremo julgou o Tema 1.279 da Repercussão Geral, que buscou a correta interpretação da modulação dos efeitos fixada no âmbito do Tema 69 da Repercussão Geral. Nesse contexto, os ministros decidiram que “não se viabiliza o pedido de repetição do indébito ou de compensação do tributo declarado inconstitucional, se o fato gerador do tributo ocorreu antes do marco temporal fixado pelo Supremo Tribunal Federal, ressalvadas as ações judiciais e os procedimentos administrativos protocolados até 15.3.2017.”
Agora, para reforçar a jurisprudência do STF, o Rel. Min. Roberto Barroso reconheceu a repercussão geral do tema e votou pela viabilidade do ajuizamento de ação rescisória contra julgados que não observem a modulação de efeitos fixada no Tema 69 da Repercussão Geral. Nas palavras do Min. “(…) considerando a necessidade de atribuir racionalidade ao sistema de precedentes qualificados, prevenindo tanto o recebimento de novos recursos extraordinários, como a elaboração de múltiplas decisões sobre idêntica controvérsia, afigura-se necessária a reafirmação da jurisprudência dominante deste tribunal, com a submissão da questão à sistemática da repercussão geral”.
Os Mins. Luiz Fux e Edson Fachin seguiram o entendimento do Relator quanto à existência de repercussão geral da matéria, mas divergiram quanto ao mérito, em respeito à segurança jurídica e ao instituto da coisa julgada. Para Fux, não caberia a via rescisória, pois “no momento de sua produção, a coisa julgada que se pretende desconstituir por meio da lide em exame estava em perfeita harmonia com a jurisprudência vinculante do Supremo Tribunal Federal, na linha da tese firmada para o tema 69 da repercussão geral, que, porquanto editada no sentido do reconhecimento de inconstitucionalidade de incidência tributária e dissociada, ainda, de modulação eficacial, espraiava os efeitos ínsitos e regulares às declarações judiciais de inconstitucionalidades, rumo à nulidade ex tunc do objeto”.
Não obstante, prevaleceu o entendimento do Relator, que foi seguido pelos Min. Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Cristiano Zanin, Dias Toffoli, André Mendonça e Cármen Lúcia.
Diante disso, fixou-se a seguinte tese: “Cabe ação rescisória para adequação de julgado à modulação temporal dos efeitos da tese de repercussão geral fixada no julgamento do RE 574.706 (Tema 69/RG)”
- STF: Não incide IRPF sobre doação em antecipação de herança
Em 22.10.2024, a 1ª Turma do STF negou, por unanimidade, agravo regimental em que a União sustentava a incidência de IRPF sobre a doação de bens efetuada por contribuinte aos seus herdeiros (Ag.Reg. RE 1.439.539).
No caso concreto, a Fazenda Nacional defendeu que o tributo seria devido sobre a variação positiva do valor do bem doado entre a data de aquisição e o momento da doação. Para a União, não haveria qualquer tipo de bitributação entre IRPF e o ITCMD, eis que o referido tributo estadual incide sobre o valor total da doação, ao passo que o IRPF seria devido somente sobre a valorização do bem.
Por unanimidade, prevaleceu o voto do Rel., Min. Flávio Dino, que entendeu que não teria se materializado o fato gerador do IRPF, tendo em vista que a antecipação legítima reduz o patrimônio do doador (ou seja, não há renda a ser tributada). Adicionalmente, reconheceu que a incidência desse imposto representaria bitributação entre Estados e União, tendo em vista a incidência do ITCMD.
- STJ: Discussão sobre a inclusão do PIS/COFINS na base de cálculo do ISS tem natureza constitucional
No final de setembro, o Min. Sérgio Kukina proferiu decisão monocrática no âmbito do AREsp 2.455.017/SP e dos REsps 2.144.749/SP e 2.144.754/SP em que decidiu que a discussão relativa à inclusão do PIS/COFINS na base de cálculo do ISS possui contorno constitucional.
De acordo com Kukina, a natureza constitucional da matéria em questão é manifesta, na medida em que esbarra em temas que foram examinados nas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) 190 e 189, nas quais o STF entendeu que, por imposição constitucional, qualquer exclusão de valores da base de cálculo do ISS depende de lei complementar.
Com isso, o Min. Sérgio Kukina determinou o sobrestamento dos referidos recursos e o envio dos autos ao STF.
- CARF aprova súmula que determina responsabilidade solidária de grupo econômico por obrigações previdenciárias
Em outubro, a 2ª Seção do CARF aprovou súmula segundo a qual “as empresas que integram grupo econômico de qualquer natureza respondem solidariamente pelo cumprimento das obrigações previstas na legislação previdenciária, nos termos do art. 30, inciso IX, da Lei nº 8.212/1991, c/c o art. 124, inciso II, do CTN, sem necessidade de o fisco demonstrar o interesse comum a que alude o art. 124, inciso I, do CTN”.
É de destacar que esse entendimento está em total desacordo com a jurisprudência das Turmas de Direito Público do STJ, que firmaram posição no sentido de que empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico não são solidariamente responsáveis entre si, exceto quando demonstrado o interesse comum (jurídico e não meramente econômico) na ocorrência do fato gerador (E.g. Ag.Int. no AREsp. 1.035.029, 1ªT, j. 27.05.2019; Ag.Rg. AREsp. 21.073, 2ªT, j. 18.10.2011).
Assim, a recente súmula tende a levar o Poder Judiciário a rediscutir questões por ele já pacificadas.
- CARF reconhece retroatividade de lei que estabeleceu o conceito de praça para fins da legislação do IPI
Em dois julgamentos realizados em outubro, a 2ª Turma da 4ª Câmara da 3ª Seção do CARF, por maioria, entendeu que a Lei 14.395/2022 – que estabeleceu definição para o conceito de “praça” – tem natureza de norma interpretativa e, por via de consequência, aplica-se a fatos geradores ocorridos antes da sua vigência (Processos 16682.722461/2015-30 e 16682.722760/2016-55).
Como se sabe, a legislação do IPI estabelece que, nas operações entre estabelecimentos interdependentes, a base de cálculo do imposto não pode ser inferior ao preço corrente no mercado atacadista da “praça do remetente”.
Essa regra sempre gerou incerteza quanto ao alcance do conceito de “praça”, especialmente nos casos de contribuintes situados em localidades onde não há outros produtores/atacadistas que comercializem os mesmos bens. Nesses casos, os próprios fabricantes acabam por definir o preço praticado em suas praças, de forma que essa regra de base de cálculo mínimo não pode ser aplicada.
Nesse particular, por um lado, os contribuintes defendiam que o conceito de “praça” era equivalente ao de município, apoiando-se, inclusive, em antigos atos normativos da SRF, que por muito tempo endossou essa interpretação (como no Parecer Normativo 44, de 23.11.1981). Por outro lado, as autoridades administrativas argumentavam que o conceito de “praça” teria um alcance mais amplo, existindo decisões que atribuíam a ele a abrangência de uma região metropolitana ou até mesmo abrangência nacional.
Para encerrar esse debate, foi aprovada a Lei 14.395/2022, que estabeleceu que o termo “praça” utilizado pela legislação do IPI é sinônimo de “município”. Para as autoridades administrativas, contudo, essa regra teria efeitos meramente prospectivos.
Diante dessa controvérsia, a Rel., Conselheira Anna Sá Malta, entendeu – no que foi acompanhada pela maioria dos conselheiros(as) – que a finalidade da lei em questão foi meramente a de elucidar conceito jurídico que já vinha sendo debatido na doutrina e no âmbito do CARF.
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[1] Vide https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2024/10/23/ccj-aprova-plano-de-trabalho-para-regulamentacao-da-reforma-tributaria